O que é Literatura?
A literatura, como manifestação
artística, tem por finalidade recriar a realidade a partir da visão de
determinado autor (o artista), com base em seus sentimentos, seus pontos
de vista e suas técnicas narrativas. O que difere a literatura das
outras manifestações é a matéria-prima: a palavra que transforma a
linguagem utilizada e seus meios de expressão. Porém, não se pode pensar
ingenuamente que literatura é um “texto” publicado em um “livro”,
porque sabemos que nem todo texto e nem todo livro publicado são de
caráter literário.
Logo, o que definiria um texto
“literário” de outro que não possui essa característica? Essa é uma
questão que ainda gera discussão em diversos meios, pois não há um
critério formal para definir a literatura a não ser quando contrastada
com as demais manifestações artísticas (evidenciando sua matéria-prima e
o meio de divulgação) e textuais (evidenciando um texto literário de
outro não literário). Segundo José de Nicola (1998:24), o que torna um
texto literário é a função poética da linguagem que
“ocorre quando a intenção do emissor está voltada para a própria
mensagem, com as palavras carregadas de significado.” Além disso, Nicola
enfatiza que não apenas o aspecto formal é significativo na composição
de uma obra literária, como também o seu conteúdo.
Cecília Meireles, recorte do manuscrito Exercício de Saudade (s.d.) da Bilbioteca Nacional Digital
“O que é literatura?” é antes de tudo
uma pergunta histórica. O que conhecemos por literatura não era o mesmo
que se imaginava há, por exemplo, duzentos anos quando, na Europa, o
gênero literário “romance” começou a se desenvolver graças ao
desenvolvimento dos jornais, que possibilitou uma maior divulgação do
gênero, mudando o que se entendia a respeito do assunto. Se antes as
“belas letras” eram compostas por composições em verso que seguiam uma
estrutura formal de acordo com critérios estabelecidos desde a
antiguidade, agora, com o advento e a popularização do romance, a forma
de se entender a literatura foi modificada e novos gêneros textuais
foram ganhando espaço. Exemeplo disso, é que, no século XX houve a
atribuição de alguns gêneros considerados “menores” como cartas,
biografias e diários à categoria “literária”.
Um dos registros mais antigos que se tem acerca do
tema deve-se a Aristóteles, pensador grego que viveu entre 384 e 322 (A.
C.). Aristóteles elaborou um conjunto de anotações em que busca
analisar as formas da arte e da literatura de seu tempo. Para isso, o
pensador elaborou a teoria de que a poesia (gênero literário por
excelência da época) era “técnica” aliada à “mimese” (imitação),
diferenciando os gêneros trágico e épico do cômico e satírico e, por
fim, do lírico. Segundo o filósofo, o que difere a arte literária,
representada pela poesia, dos textos investigativos em prosa é a
qualidade universal que a imitação permite. Ao imitar o que é diferente
(épico e tragédia), o que é inferior (comédia e sátira) e o que está
próximo (lírico), o artista cria a “fictio”, isto é, “ficção”,
inventando histórias genéricas, porém verossímeis.
Os escritos de Aristóteles são questionados
nos dias de hoje, uma vez que a literatura sofreu uma evolução sem
precedentes nos últimos séculos, aceitando novos gêneros e presenciando a
criação de novos meios de veiculação, como a internet. Todos esses
fatores acabam “diluindo” a definição clássica de literatura e gerando
novas atribuições ao longo de seu desenvolvimento e recepção.
Referências:
NICOLA, José de. Literatura Brasileira: das origens aos nossos dias. São Paulo: Scipione, 1998.
Não há uma definição estabelecida acerca do conceito
de literatura. Ela varia de acordo com o momento histórico e com as
condições de recepção de seu material (porque embora a literatura seja
basicamente composta por textos literários, ainda há inúmeras discussões
acerca do que seria esse “texto” e de quais seriam seus meios de
difusão). Além disso, pode-se acrescentar que a literatura é, na
realidade, uma reunião de diversos aspectos estruturais, sociais e
culturais dentro de uma manifestação textual.
Há artistas, como o poeta
norte-americano Ezra Pound (1885-1972), que afirmam que o poeta tem uma
função social porque sua obra e suas palavras estão carregadas de
significado. O poeta também diz que os escritores possuem uma função
social definida em razão de se encontrarem na posição de escritores, de
trabalhadores das palavras e, portanto, possuem responsabilidade social.
Sabemos que a literatura além de refletir a realidade vista pelos olhos
dos artistas, é um veículo de disseminação de ideias e, independente de
seu teor, causa determinados impactos e sensações no imaginário de seus
leitores.
Segundo o teórico Jonathan Culler (1999:33-34) a literatura é um ato de fala
que contrasta com outros tipos de atos de fala. O que acontece,
geralmente, é que os leitores acabam identificando o ato de fala
literário por este se encontrar em um meio associado à literatura (como
por exemplo: livro de poemas, seção indicada em uma revista literária,
biblioteca etc.), além disso, o texto literário se diferencia dos textos
não literários em razão da atenção dispensada nesse
tipo de texto, isto é, não é esperado que se leia um romance ou um poema
como se fosse uma manchete de jornal ou um anúncio nos classificados,
ou ainda como se estivéssemos ouvindo uma notícia veiculada no rádio ou
na televisão.
Podemos ir ainda mais além e pensar que o que
diferencia um texto literário de um não literário é a maneira como a
narrativa é construída. No romance, predomina a narrativa ficcional em
forma de prosa (geralmente uma história inventada, com personagens
inventados e um conflito específico que norteia as atitudes dos
personagens), na poesia, versos seguindo estruturas formais ou livres
(sem rima) sobre diferentes assuntos. Essas especificações com relação
às formas é o que caracterizam os gêneros textuais.
O que diferencia a literatura dos demais
textos do “dia a dia” é o seu caráter ficcional. Porém, esse conceito
também é questionável, uma vez que temos diversas manifestações textuais
que podem ser consideradas literatura, como por exemplo, livros
escritos baseados em acontecimentos reais, como é o caso do livro A
sangue frio (1966) do escritor e jornalista norte-americano Truman
Capote (1924-1984). Esse livro ficou conhecido como pertencente a um
gênero intitulado “jornalismo literário”, pois Capote acompanhou
pessoalmente o desenrolar do caso registrou os fatos presenciados e os
depoimentos das testemunhas em forma de romance. Nele, o autor se baseia
em um evento não ficcional para produzir um romance no estilo
jornalístico, porém, permeado de subjetividade e de literariedade.
O mesmo acontece com o livro Os Sertões
(1902), do brasileiro Euclides da Cunha (1866-1909). Considerado um
clássico da literatura brasileira, seu relato acerca do conflito em
Canudos é preciso, porém, o texto literário deve-se ao estilo narrativo
de Euclides, recheado de elementos do gênero, e segue sendo estudado nas
escolas e nas faculdades de Letras.
Outro exemplo são os documentos dos viajantes
que vieram ao Brasil na época de seu descobrimento. Seriam eles
considerados textos literários? É pouco provável, pois, formalmente,
tratam-se de textos descritivos responsáveis pelo levantamento da vida e
dos costumes no território brasileiro caracterizando o que se
convencionou chamar de “literatura informativa”, que
não possuiria o mesmo status da literatura ficcional. Porém, é inegável
que a Carta a el-Rei Dom Manuel sobre o achamento do Brasil, de autoria
de Pero Vaz de Caminha e outros documentos relativos ao descobrimento,
tenham valor literário, pois se tratam de belíssimos textos, ricos não
apenas em descrições, mas também na narrativa de alguns episódios
ocorridos durante a expedição liderada por Pedro Álvares Cabral, no caso
da narrativa de Caminha.
Há também uma forte discussão em torno das Histórias em Quadrinhos.
Embora inseridas em uma linguagem diferente da literária (isto é, a
linguagem gráfica), a parte narrativa das histórias assemelha-se muito
ao material literário em prosa e verso. Não é à toa que a adaptação de
romances e contos para histórias em quadrinhos se mostrou uma atividade
popular e que tem se desenvolvido bastante no final do século XX e
início do XXI.
Referências:
CULLER, Jonathan. Teoria Literária: uma introdução. São Paulo: Beca Produções Culturais, 1999.
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